Acolhimento na Educação Infantil: amor e responsabilidade

Por Ana Luiza Ogando  |  02 de fevereiro de 2023

 

“A educação tem a ver com amor e responsabilidade. É o ponto em que decidimos se amamos o mundo o bastante para assumir a responsabilidade por ele e o renovamos com a chegada dos mais novos.” 

(Jorge Larrosa)

 Tarefa diária dos professores e funcionários da escola, o acolhimento segue por todo percurso escolar. Acolher é oferecer olhares, atenção, tempo, escuta, cuidado, disponibilidade. O acolhimento está no carinho dos funcionários no portão de entrada da escola, na confiança na capacidade da criança em cuidar de si e de seus pertences, na ambientação das salas e corredores feita pelas auxiliares para receber a meninada, na seleção de materiais e objetos para atender às particularidades de cada turma, na escuta atenta aos conflitos e mediação destes, no comprometimento dos professores com as intencionalidades pedagógicas durante as propostas e atividades, etc. Ou seja, a acolhida às crianças atravessa a experiência escolar de muitas maneiras. É uma postura de respeito à infância

É muito comum que os termos acolhimento e adaptação sejam confundidos ou até mesmo usados como sinônimos. O que ocorre, de fato, é que um integra o outro. É primordial que na fase de adaptação, ou seja, no período de familiarização das crianças com o ambiente escolar, estas sintam-se acolhidas para que possam construir os vínculos neste novo espaço. No entanto, a ideia de  adaptação vincula-se aos primeiros dias da vida escolar de uma criança, em um movimento gradativo que vai se construindo nas interações. Não tem uma data específica para acabar, pois cada criança vive um processo único. 

Uma criança sente-se acolhida no ambiente escolar quando tem seus direitos respeitados e contemplados. De acordo com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), as crianças têm os seguintes direitos de aprendizagem: conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e conhecer-se. 

DIREITOS DE APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL


Conviver com outras crianças e adultos, em pequenos e grandes grupos, utilizando diferentes linguagens, ampliando o conhecimento de si e do outro, o respeito em relação à cultura e às diferenças entre as pessoas.

Brincar cotidianamente de diversas formas, em diferentes espaços e tempos, com diferentes parceiros (crianças e adultos), ampliando e diversificando seu acesso a produções culturais, seus conhecimentos, sua imaginação, sua criatividade, suas experiências emocionais, corporais, sensoriais, expressivas, cognitivas, sociais e relacionais.

Participar ativamente, com adultos e outras crianças, tanto do planejamento da gestão da escola e das atividades propostas pelo educador quanto da realização das atividades da vida cotidiana, tais como a escolha das brincadeiras, dos materiais e dos ambientes, desenvolvendo diferentes linguagens e elaborando conhecimentos, decidindo e se posicionando.

Explorar movimentos, gestos, sons, formas, texturas, cores, palavras, emoções, transformações, relacionamentos, histórias, objetos, elementos da natureza, na escola e fora dela, ampliando seus saberes sobre a cultura, em suas diversas modalidades: as artes, a escrita, a ciência e a tecnologia.

Expressar, como sujeito dialógico, criativo e sensível, suas necessidades, emoções, sentimentos, dúvidas, hipóteses, descobertas, opiniões, questionamentos, por meio de diferentes linguagens.

Conhecer-se e construir sua identidade pessoal, social e cultural, constituindo uma imagem positiva de si e de seus grupos de pertencimento, nas diversas experiências de cuidados, interações, brincadeiras e linguagens vivenciadas na instituição escolar e em seu contexto familiar e comunitário.

 

Recentemente uma criança que já foi minha aluna, ao me abraçar,  relatou:

"Até hoje eu tenho aquela notícia com uma foto que tem você e minha mãe. Antes eu chorava quando chegava na escola."

Tratava-se da primeira notícia da meninada enviada às famílias no retorno presencial, em 2021. O que essa criança demonstrou foi que, além de guardar em casa com sua família um registro importante do seu percurso escolar, ela também guarda na memória o acolhimento em seus momentos de chegada. Ela sabe que avançou e percebe que estava amparada pelo carinho dos adultos à sua volta. Quantos direitos de aprendizagem contemplados nessa cena!

Destaco ainda três situações vivenciadas na Educação Infantil da Escola Balão Vermelho que evidenciam o acolhimento: os rituais de passagem, as rodas de conversa e os projetos.  

No primeiro dia de aula do calendário escolar, acontecem os rituais de passagem de uma turma para outra. As crianças veteranas são recebidas pela professora do ano anterior em um ambiente conhecido e agradável e somente após uma roda de conversa acolhedora  são apresentadas à nova professora.

As rodas de conversa são momentos primorosos para acolher as demandas da meninada. Nesse espaço de verbalizar ideias e sentimentos, as crianças contribuem com relatos de experiências vividas e apresentam suas hipóteses sobre sua leitura de mundo. O professor cuida para que todos possam falar e serem ouvidos. 

Jorge Larrosa, autor da epígrafe deste artigo, afirmou: 

Cada professor vê beleza na sua disciplina: os de matemática nos teoremas, de química na tabela periódica dos elementos, de geografia na formação calcária na montanha, de história em um pedaço de cerâmica medieval. Todo professor sabe que esses pequenos elementos são capazes de revelar o mundo e se emocionam quando sabem que seu trabalho valeu a pena e quando são capazes de transmitir aos alunos esse amor. Então, só um professor enraizado na beleza do mundo, seja a língua, a música, os teoremas ou as montanhas, pode introduzir as crianças nessa beleza e nessa pátria que é o mundo. 

Na Escola Balão Vermelho, promovemos situações em que os alunos se identificam como sujeitos da própria história, sendo ouvidos e acolhidos. É parte do currículo que as crianças possam pesquisar sobre assuntos de seu interesse. Com escuta atenta, os professores constroem projetos com seus alunos a partir de temas relevantes para o grupo. 

O acolhimento não se encerra. É ato de amorosidade que se perpetua ao longo da vida escolar. Vale destacar que acolher a criança deve contemplar as relações de parceria entre a família e a escola. É nosso compromisso promover um ambiente acolhedor para toda a comunidade escolar com diálogo permanente com as famílias para a manutenção desse vínculo.

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